segunda-feira, 14 de abril de 2008

Gente da Antiga - Pixinguinha, Clementina de Jesus, Joao da Baiana - 1968


A postagem deste disco foi quase que chorando, pedido feito pelo DJ Mucio Guimaraes e atendido pelo Musica da Minha Gente, um disco perfeito, onde sem ensaios e conversinhas foi feito de uma simplicidade unica, que demonstra que a verdadeira musica está presente na alma do artista e nao no que eles sempre querem fazer sem saber, agora mais do que nunca, um disco obrigatorio para todos voces refletirem e saber o do que e o porque o Brasil é sempre o melhor, e o samba é um patrimonio da humanidade, entao, deleitem-se!!!
Saravá!!!
Lado B

Para quem deseja conhecer as raízes do samba este é um disco obrigatório, amostra única de um momento de três artistas que fizeram deste um marco atemporal na história musical brasileira.


Falar sobre Gente da antiga não é fácil. De início, a foto da capa já intimida. As feições de Clementina de Jesus, Pixinguinha e João da Bahiana parecem transmitir a quem olha o sentimento de alegria e descontração que imperava naquele ambiente de gravações, onde não houve praticamente nenhum ensaio
Gente da Antiga foi gravado em três dias, entre 10 e 17 de janeiro de 1968. Para acompanhar João da Baiana (pandeiro e voz), Clementina de Jesus (voz), Hermínio chamou Dino e Meira (violões), Canhoto (cavaquinho), Pixinguinha (sax-tenor), Marçal, Gilberto Luna e Jorge Arena (percussão), mais Nelsinho (trombone), Manuelzinho (flauta) e o coro formado por Nelson Sargento, Jairzinho da Portela, Pedro Rodrigues, Copacabana, Jair Avellar, Anescar e Nelsinho.

As faixas são:

1) Oito Batutas: instrumental assinado por Pixinguinha e Benedito Lacerda, na verdade se trata de criação original do primeiro. Benedito era o caso comum em que o co-autor entrava na parceria porque fazia o papel do divulgador. O nome da faixa remete ao tempo do cinema mudo, em 1919, quando Pixinguinha tocava em um bloco carnavalesco, chamado Grupo de Caxangá. Quando o conjunto foi recrutado para chamar a freguesia para as fitas no Palais, os caxangás foram reduzidos a um octeto. O dono do cinema, Isaac Frankel, os batizou de Os Oito Batutas. Contratados para concorrer com Ernesto Nazareth, do Odeon, acabaram transformando o velho pianeiro em fã. O choro apresentado mostra-se integrado ao estilo de época, em que os sambas gravados ainda sofriam influência de maxixes, toadas sertanejas, corta-jacas e lundus.

2) Yaô: o compositor Gastão Viana tinha o hábito de utilizar palavras africanas em suas letras. Nesta parceria com Pixinguinha, um típico lundu (transformado em samba) aparecem, por exemplo, expressões como akicó (galo), jacutá (casa), pelu adié (peru que rodopia entre as galinhas) e Yaô (mulher filha de santo). O compositor, que antes havia gravado "Yaô" originalmente em 1950, num dos raríssimos momentos em que Pixinguinha cantou em disco, deixou o vocal desta vez para o amigo João da Baiana.

3) Roxá: tema folclórico, um cateretê, cantado por Clementina de Jesus: "roxá, vamo vadiá minha nega! Roxá vamo vadiá minha nega!", o coro repete e bate palmas. "Roxá" é típico exemplo de samba de partido alto, típica das rodas de pernada do começo do século passado, onde o cantor principal entoava o tema principal, e os demais integrantes da roda improvisavam e respondiam.

4) A Tua Sina: outra canção folclórica, entoada por Clementina: "mulher/ a tua sina/ é viver/ no mei de vagabundo/ Não sei por que/ Você nasceu assim/ A tua vida/ É a desgraça do mundo". Detalhe para o solo de sax de Pixinguinha.

5) Elizete no Chorinho: instrumental, um belo dueto de flauta e saxofone, entre Manoelzinho e Pixinguinha.

6) Quê, Quê, Quê, Querê, Quê: composto por João da Baiana, a data da criação deste corimá se perde no tempo em que o batuque ainda guardava raízes fortemente religiosas, e o sincretismo da linguagem nagô com mitos religiosos africanos e cristãos. Para tanto, basta observar a saudação inicial, onde João diz: "louvado seja meu Senhor Jesus Cristo", e o coro responde "Para sempre será louvado", seguido de:
- Viva gente de linha de Angola - viva!
- Viva gente de linha de Nagô - viva!
- Viva gente de linha de Ijexá - viva!
7) Mironga de Moça Branca: outro corimá, cantado em nagô, desta vez interpretado por Clementina, com a participação de João. "Mironga", ao contrário do que se diz em expressão corrente, vem do Quimbundo e significa: "mistério" ou "segredo".

8) Cabide de Molambo: uma das mais notáveis criações de João da Baiana, foi composto na década de 10 e concluída em 1917. Só seria gravado porém 1932, por Patrício Teixeira e Orquestra Copacabana. É designado pelo autor como um samba tradicional. Tanto o título quanto a letra (dessa vez, cantada em português) são inspirados em um malandro que, em idade provecta, já era uma lenda urbana, cujo nome era desconhecido, e todos o chamavam de "Cabide de Molambo", dado a sua mania de disfarçar elegantemente a sua condição de andrajo: "Meu Deus eu ando/ com o sapato furado/ tenho a mania/ de andar engravatado/ a minha cama/ é um pedaço de esteira/ é uma lata velha/ que me serve de cadeira". Consta que ele era quase poeta, alfabetizado, mas vivia dependendo de amigos para sobreviver. O jovem João da Baiana o conheceu na tendinha do Tinoco (citada na letra), na Gamboa. A ancestralidade da música pode ser observada nos versos, como "a gravata foi achada na Ilha da Sapucaia", ou "as botina foi dum véio/ da revolta de Canudo".

9) Batuque na Cozinha: outro samba de João da Baiana, desta vez do tempo em que seus avós tinham uma quitanda de artigos religiosos no Largo do Sé - justamente do tempo em que samba ainda se fazia "na cidade", como o autor ressaltou, ou seja, antes da população negra ser mandada para o morro, no começo do século XX. "Batuque na cozinha/ sinhô não qué/ por causa do batuque/ eu queimei meu pé".

10) Aí, seu Pinguça: instrumental de Pixinguinha, entremeado pelo refrão cantado pelo conjunto de coro, o tema que dá nome à canção.

11) Fala Baixinho: outro tema instrumental de Pixinguinha, em que Hermínio Bello de Carvalho pôs versos. A música concorreu em festivais. No álbum, ela aparece apenas em forma de choro. O estilo dessa canção lembra uma polca do tempo em que as raízes européias foram sendo transformadas graças às peculiaridades locais da música brasileira. Essa relação era muito comum na virada do século XIX para o XX, quando faziam sucesso grandes chorões, como Pedro Galdino e Paulino Sacramento, entre outros.

12) Estácio, Mangueira: Clementina de Jesus encerra o disco com esse samba tradicional. Talvez toda a inefável personalidade e talento da rainha Quelé se encerre em sua interpretação, e explica o motivo pela qual a cantora conquistou, em pouco tempo, tanto crítica quanto público - com exceção de sua ex-patroa, que dizia que a voz dela parecia "miado de gato". Miado que era a quintessência do folclore e o amálgama do batuque dos terreiros com o samba urbano. Sobre Clementina, disse Paulinho da Viola, certa vez: "Ouvi-la cantando, sentada, com o seu vestido de renda, era algo absolutamente fascinante, difícil de transmitir, de traduzir em palavras".

Download: Gente da Antiga - Pixinguinha, Clementina de Jesus, Joao da Baiana - 1968

Um comentário:

Falcao disse...

Opa
valeu muito pelo post.
Pra mim Pixinguinha, Tom e Gonzagao sao os deuses da musica brasileira.