sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Chico Buarque de Hollanda - Chico Buarque de Hollanda - 1966

Leiam o texto, ele fala por si, salve Mauro Ferreira!
Daniel de Mello e a Música da Minha Gente
Saravá!!!

Chico Buarque de Hollanda 1966, A primeira obra da grande construção

A banda de Chico Buarque passou em 1966 sem atropelar as tradições da música brasileira. Embora moldado pela modernidade coloquial da Bossa Nova, o nobre carioca - nascido em 19 de junho de 1944, filho do historiador Sérgio Buarque de Hollanda - abriu a cortina do passado e evocou os cânones do samba pré-bossa neste primeiro álbum, feito para a extinta gravadora paulista RGE com produção do tropicalista Manuel Barenbein. Ora reeditado pela Som Livre, 40 anos depois de seu lançamento, Chico Buarque de Hollanda foi a primeira obra na grande construção que o artista ergueria ao longo dessas quatro décadas.
Precedido por compacto de 1965 que lançou Sonho de Carnaval (inscrita no I Festival Nacional de Música Popular Brasileira, da TV Excelsior) e Pedro Pedreiro (primeiro exemplo mais concreto da habilidade do autor de juntar versos com a precisão com que um arquiteto projeta construções), o álbum chegou às lojas dez anos depois de o compositor arriscar suas criações iniciais, umas operetas que permaneceram restritas ao seu círculo familiar. A primeira composição bem acabada, Canção dos Olhos, data de 1961. Mas o próprio Chico considera Tem Mais Samba - a segunda faixa deste disco - o primeiro tijolo de sua obra oficial. A música foi composta em 1964 para o musical Balanço de Orfeu.
Chico Buarque de Hollanda chegou às lojas no faro da explosiva vitória dividida por A Banda com Disparada no II Festival de Música Popular Brasileira, da TV Record. A partir de 10 de outubro de 1966, data da final da competição, Chico Buarque virou justa unanimidade nacional. A Banda, marcha-dobrado composta naquele ano fértil de 1966, deu projeção a este disco que rastreava a melhor produção autoral de Chico Buarque até então. Meu Refrão (1965) batizara show dividido com o grupo MPB-4 e a cantora Odete Lara na boate carioca Arpège. A Rita (1965) citava Noel Rosa (1910 - 1937) na letra, mostrando que seu autor incorporara a verve do bamba - e a de sambistas como Ismael Silva (1905 - 1978), contemporâneo de Noel - na sua construção que amalgamava sambas e marchas-ranchos.
Espécie de precursora de Carolina, Ela e sua Janela (1966) exibe a face mais lírica do compositor. Símbolo da postura contemplativa diante da vida, a janela aparece também no manemolente samba Juca (1965), em que o personagem-título cai nas garras da polícia por sambar em frente à janela de sua Maria. Outra mulher, a Madalena, também acaba sendo a causadora do infortúnio do amado na melancólica Madalena Foi pro Mar (1965), gravada por Nara Leão (1942 - 1989) no disco Nara Pede Passagem (1966), que traria ainda Olê, Olá e Pedro Pedreiro, marco inicial da politização que nortearia a obra de Chico nos anos 70. Intérprete visionária e com livre trânsito nas esferas da bossa nova e da então nascente MPB, Nara avalizou a obra do compositor iniciante e entrelaçaria definitivamente sua biografia com a do compositor ao defender A Banda no histórico festival que consagraria Chico em âmbito nacional.
Completam o repertório do disco Amanhã, Ninguém Sabe (1966), Você Não Ouviu (1966) e Olê, Olá (1965), uma das músicas mais sólidas da construção de Chico Buarque, lançada em compacto de 1966 que precedeu este álbum (no outro lado do compacto, Meu Refrão). Ao todo, Chico Buarque de Hollanda apresenta 12 músicas de autoria exclusiva do compositor em 26 minutos e 43 segundos. Na ficha técnica, músicos como Toquinho, ao violão. Ouvido 40 anos depois, o disco ainda conserva frescor e faz jus às saudações entusiásticas da época. Como a do o jornalista Sérgio Porto (1923 - 1968), por exemplo. O célebre Stanislaw Ponte Preta afirmaria em crônica que Chico Buarque de Hollanda era "a melhor coisa que aconteceu num estúdio de gravação nos últimos tempos" . Tinha razão. A música brasileira nunca mais foi a mesma depois que a banda de Chico Buarque passou, arrastando modernidade e tradição.

Mauro Ferreira
Junho de 2006
http://blogdomauroferreira.blogspot.com

Download: Chico Buarque de Hollanda - Chico Buarque de Hollanda - 1966